
Mais uma vez os Coliseus das principais cidades portuguesas receberam uma série de actuações da Ópera do Malandro.
Com textos baseados na Ópera do Mendigo, de John Gay, e na Ópera dos Três Vinténs, de Bertolt Brecht e Kurt Weill, a Ópera do Malandro conta a história do contrabandista Max Overseas, das suas aventuras amorosas e não só.
A obra prima de Chico Buarque foi encenada pela primeira vez em Julho de 1978, quando se assistia a uma maior abertura na sociedade brasileira, e ao início do processo de redemocratização na ditadura militar que se vivia no Brasil. Por coincidência ou não, a Ópera do Malandro decorre na Lapa, Rio de Janeiro, dos anos 40, durante o final da Era Vargas e a Segunda Guerra Mundial. O paralelismo entre as duas épocas fará certamente muito sentido já que em ambos os períodos a ditadura era uma realidade.
A crítica feita na peça é dirigida aos novos burgueses, por contraponto aos que viviam com bastante dificuldade; à corrupção policial, à americanização do país, etc.
Mais concretamente à Ópera que nos foi trazida, o elenco conta com certa de 20 actores que acumulam também as funções de cantores e bailarinos, e uma orquestra de mais de 10 elementos. As personagens dividem se sobretudo entre contrabandistas e prostitutas.
O elenco que veio a Portugal desta vez, sofreu algumas mudanças em relação ao que nos trouxe o espectáculo em 2005. Um novo Max Overseas (Cláudio Lins em vez de Alexandre Schumacher), um novo Fernandes de Duran (Nuno Leal Maia no lugar Mauro Mendonça) e uma nova Vitória (Lucinha Lins em vez de Selma Reis).
Se a última a escolha foi a melhor, já que Lucinha Lins personifica de uma maneira irrepreensivel a mãe de Teresinha, protagonizando alguns dos melhores momentos do espectáculo, com as músicas Viver do Amor e Uma Canção Desnaturada, a escolha de Cláudio Lins veio desacreditar em muito o nosso malandro, apesar de ao nível da representação o actor não ser muito criticável, a nível da interpretação musical deixa muito a desejar, isto porque, a voz do actor não tem força, nem densidade suficiente para o papel de protagonista.
Em relação a Nuno Leal Maia, a escolha não poderia ter sido mais azarada e só não afecta mais a peça porque a personagem Duran tem um papel secundário na acção e os encenadores tiveram o bom senso de o retirar de algumas das suas interpretações,uma vez que o actor se mostra incapaz de cantar.
Em relação aos outros actores, destaque pela positiva para Alessandra Maestrini (Lúcia) e André Falcão (Barrabás).
A simplicidade dos cenários, que se assemelham a um coliseu romano e são inspirados nos arcos existentes na Lapa Carioca, fazem com que nos concentremos apenas na acção.
Esta acção absorve-nos de uma maneira tal, quer pela história, quer pela qualidade musical, que nos impele a acompanha-la com um bater de pé sincopado ou até mesmo, para os mais ousados, cantarolando.
O sentimento que predomina durante o espectáculo é que nunca mais queremos que acabe, nunca mais queremos sair daquele cenário carioca. E quando finalmente pensamos “acabou”, o génio de Chico Buarque cria um volte-face no desfecho que deixa as almas mais desprevenidas boquiabertas.
Em suma, a Ópera do Malandro é um dos espetáculos mais intensos e sublimes que já assisti, e por isso... Viva o Malandro.